Treinamentos comportamentais

 coautora Elisângela Paes Leme
Psicologia do trabalho

Psicologia Escolar

Historicamente, o Brasil enfrenta uma situação insustentável de fracasso escolar, traduzido pela não aprendizagem da leitura e da escrita pelas crianças. Se na década de 1970 esse fracasso atingia cerca de 56% das crianças que iniciavam o 1º. Grau, atualmente há que se denunciar a persistência de, ainda, 19,5% de evasão e repetência escolar, fato que expressa uma enorme inadequação entre a demanda e a qualidade da oferta, caracterizando nossa escola como muito excludente. As tentativas de respostas a essa situação sempre foram atravessadas por um processo de culpabilização: ora são os professores os culpados, ora os pais e sua situação sócio, econômica e cultural, ora os alunos são responsabilizados por seu insucesso. Neste contexto, usa-se e abusa-se da expressão “dificuldades de aprendizagem”, colocando-se sobre os ombros da criança uma imensa carga negativa. Do lugar, inicialmente, de psicóloga, Elisângela tomou a decisão de apurar seu olhar para os processos de encaminhamento ao apoio pedagógico de crianças que, supostamente, não aprendem. Adentrou a escola, escrutinou a cultura escolar, observou práticas pedagógicas, constatou concepções discrepantes, escutou professores e alunos, mediou relações, transformou-se em pesquisadora da educação. Alunos indicados para o apoio, carregados de estigma como crianças com problemas emocionais, dispersas, desligadas, estranhas, inseguras e que não gostam e não aprendem a ler e a escrever, ao final do processo tiveram desempenho superior aos das não indicadas. Assim, o texto "Leitura e escrita no contexto escolar contemporâneo" inverte a lógica perversa de mútuas acusações e descortina a complexidade do processo educacional no mundo contemporâneo, tornando-se leitura obrigatória, em especial, para professores, psicólogos e formadores de professores.

Dra. Cancionila Janzkovski Cardo

Prefácio do livro Leitura e escrita no contexto escolar contemporâneo



É com imensa satisfação que me disponho a apresentar o livro de Elisangela. O longo diálogo com essa psicóloga, hoje mestre em educação, interessada em questões pedagógicas foi um desafio extremamente agradável, dada a perspicácia e voracidade dessa educadora, em relação  ao necessário mergulho em águas nem sempre brandas, nem sempre claras da educação escolar. A função de psicóloga escolar e educacional que a autora exerceu em uma escola de ensino fundamental reservou-lhe surpresas inusitadas, acrescentando-lhe elementos de reflexão no esforço que assumiu em apurar o olhar e a escuta articulando dois papéis: o de psicóloga e o de pesquisadora da educação.
Acostumada ao olhar pautado nos fundamentos psicológicos, especialmente focado em Winnicott, a autora expandiu seus horizontes, associando aos importantes conceitos dessa área, os conhecimentos oriundos da apropriação de leituras de outros autores –  menos conhecidos em função da sua área de formação – voltados para temas emblemáticos como metodologia do ensino nas séries iniciais do Ensino Fundamental; relações interpessoais e intervenções pedagógicas no cotidiano das salas de aula; formação continuada e apropriação do conceito de criança: no contexto contemporâneo; aspectos da alfabetização e produção escrita em situação de apoio pedagógico. O resultado foi um casamento promissor, entre psicologia e pedagogia, com foco na principal razão dos esforços conjugados das ciências da educação: a infância brasileira.
Elisangela descortina aspectos relevantes da indicação de alunos para o chamado “apoio pedagógico” de crianças consideradas, pela escola,“lentas”, “indisciplinadas”, “mimadas”, “desatentas” enfim...“problemas”. De fato, a tradição educacional, considerando a trajetória escolar um processo linear que deve ser vivenciado por todos os alunos no mesmo ritmo e do mesmo modo, aqueles alunos que não se ajustam às regras disciplinares, ou não se comportam adequadamente na sala de aula, fugindo da linearidade proposta pelo sistema de ensino, são entendidos como portadores de manifestações sintomáticas e são, a partir do senso comum, pré-rotulados pelo professor como portadores de alguma dificuldade ou disfunção.
No desempenho de sua função, a autora, já experiente em conversar com crianças e adolescentes, procurando compreender as diferentes razões/motivações que os levam a apresentar alguma dificuldade nas relações interpessoais e/ou no aprendizado escolar, passou a interrogar-se sobre o elevado percentual de alunos nessa condição e tomou a si a tarefa de compreender melhor as relações estabelecidas nesse processo. As “dificuldades” estavam sendo atribuídas, numa porcentagem relevante, às questões emocionais, sem questionamentos relacionados aos aspectos pedagógicos ou intra escolares.
A proposta de intervenção, discutida e aceita pela escola, permitiu à pesquisadora/psicóloga/pedagoga maior aproximação aos sujeitos envolvidos, de modo a poder contribuir com sua análise, abrangendo assim diferentes e ricos aspectos dos meandros do cotidiano da sala de aula. Uma de suas importantes conclusões aponta para a necessidade da adoção de procedimentos didáticos que consideram as condições interacionais e discursivas de uso da linguagem e, a criança, como sujeito multidimensional, oriunda de um contexto cultural contemporâneo, com todas as características próprias desse meio social. Outro aspecto importante foi a valorização do espaço de apoio pedagógico, como espaço acolhedor, permitindo à  criança um encontro lúdico e criativo, especialmente com a produção escrita .
Nas palavras de Elisangela: “Nesse espaço a criança pode falar, sem receio de ser discriminada ou punida, um lugar em que a sua opinião é ouvida, tendo a liberdade de falar das suas insatisfações com amigos, irmãos, pais e professoras. Um lugar onde pode se expressar com liberdade”. Quanto aos professores afirma: “[...] Nessa fala diferenciada, as professoras têm a oportunidade de refletir sobre as suas ações, como por exemplo, as interferências da vida pessoal que são projetadas e/ou transferidas para sala de aula”. Para a autora é somente conhecendo melhor as relações que se estabelecem em sala de aula, mediadas pelas interações interpessoais, e respeitando a subjetividade que se constrói no social, que se pode criar meios para que o trabalho pedagógico resulte em maior sucesso no processo de ensino-aprendizagem da linguagem escrita e práticas de leitura.
Os detalhes dessa investigação são surpreendentes. Fica aqui o convite à leitura dos resultados de um trabalho criterioso, em que a escola, cenário das reflexões, e seus sujeitos merecem todo o respeito da pesquisadora. Considero uma contribuição inestimável no campo das práticas pedagógicas. Somente o diálogo com a autora e seus sujeitos possibilitará ao leitor inserir-se nessa grande aventura.

  Dra.Lázara Nanci de Barros Amâncio